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diálogos cabanellos
03 dez - 2024
Entenda as regras ESG europeias com impactos na agroindústria do Brasil
CONTEXTO DE SUSTENTABILIDADE NO MERCADO
Nos últimos anos, o Brasil e diversos países do mundo têm criado regras e normas ligadas à sustentabilidade de atividades, produtos e serviços, tudo no horizonte de metas que se relacionam com mudanças climáticas e práticas mais sustentáveis no mercado, nas empresas e companhias privadas.
Na União Europeia, diversas regras de sustentabilidade e estratégias ESG corporativas foram publicadas e estão sendo exigidas de empresas europeias e estrangeiras. E estes padrões ESG europeus deverão impactar importantes setores da economia brasileira nos próximos anos.
Essas regras têm efeitos sobre as relações comerciais e estão voltadas ao controle sobre os impactos em temas ambientais, climáticos, sociais, de direitos humanos e governança corporativa nas cadeias de negócios.
Os advogados Bruno Teixeira Peixoto e José Augusto Medeiros, sócios da área de Integridade Corporativa & ESG (Environmental, Social and Governance) do Cabanellos Advocacia, desenvolveram este material para que clientes, parceiros, empresas e companhias entendam os pontos principais das normativas ESG recentemente criadas pela União Europeia e que devem trazer grandes impactos e exigências para o mercado brasileiro.
1. QUAIS SÃO AS REGRAS ESG EUROPEIAS E O QUE ELAS EXIGEM?
I) Lei Antidesmatamento Europeia sobre produtos e serviços
Recentemente discutida pela diplomacia brasileira e de outros países, como Estados Unidos, Itália e Alemanha, importante regra de ESG da União Europeia com grandes impactos na indústria e no agronegócio no Brasil é a Lei Antidesmatamento europeia.
A lei proíbe a entrada e a comercialização de produtos e serviços brasileiros no mercado europeu, caso estejam ligados a áreas com desmatamento realizado após 31 de dezembro de 2020, inclusive quando se tratar de desmatamento autorizado legalmente.
Na lista de produtos impactados estão carne, café, óleo de palma, soja, madeira, celulose, papel, borracha e derivados como couro, móveis e chocolate, itens produzidos e exportados por indústrias catarinenses.
Apesar da sua postergação para 31 de dezembro de 2025, diversos setores da indústria, agronegócio, serviços e exportações no Brasil não estão preparados em suas estruturas, políticas e mecanismos de gestão para atenderem à regra antidesmatamento europeia.
O descumprimento dessa regra europeia prevê multas de até 4% do faturamento líquido da empresa, além da apreensão dos produtos irregulares.
II) Regra de Diligência Prévia sobre Impactos ESG
A Comissão Europeia publicou outra normativa que deve trazer grandes impactos para a agroindústria do Brasil. Essa regra se refere à Diretiva de Diligência Prévia Corporativa, em vigor desde julho de 2024, e exige de empresas e companhas no bloco europeu a implementação e publicação sobre como gerenciam os impactos dos seus negócios em questões ambientais, climáticas, de direitos humanos e de governança.
O cumprimento dessa regra europeia será progressivo. Em 2027, as empresas com 5.000 colaboradores e faturamento superior a 1,5 bilhão de euros. Em 2028, as empresas com mais de 3.000 funcionários e faturamento de 900 milhões de euros, e em 2029, as empresas com mais de 1.000 funcionários e faturamento de 450 milhões de euros.
A multa pelo descumprimento pode chegar até 5% do faturamento líquido da empresa, além de possível repercussão judicial em caso de danos comprovados.
III) Regra de Relatórios de Sustentabilidade ESG
A terceira regra ESG publicada pela União Europeia é ligada aos Relatórios de Sustentabilidade Corporativa. Em vigor desde janeiro de 2023, a normativa passou a exigir das empresas e companhias europeias e das que tenham negócios no bloco europeu a publicação de relatórios sobre informações de sustentabilidade e de desempenho em metas de ESG.
A obrigatoriedade da normativa se inicia já em 2025, em que empresas com faturamento acima de 150 milhões de euros deverão publicar os relatórios contendo as informações sobre suas estratégias de governança, gestão de riscos e impactos em temas ambientais, climáticos, de direitos humanos e governança corporativa. Uma das exigências destes relatórios será a aplicação de estudos de dupla materialidade, um método de avaliar os temas e assuntos ESG mais relevantes nos negócios.
2. QUAIS SÃO OS IMPACTOS DESSAS REGRAS ESG EUROPEIAS PARA O MERCADO E A INDÚSTRIA BRASILEIRA?
Como visto, entre as 03 (três) regras ESG europeias publicadas, 02 (duas) já estão valendo e em vigor (Regra de Diligência Prévia e de Relatórios de Sustentabilidade), o que confirma um cenário em curso de relevantes riscos e impactos para as pequenas, médias e grandes empresas brasileiras que tenham relações comerciais e forneçam produtos ou serviços na Europa ou ainda que integrem cadeias de produção de companhias europeias.
Alguns impactos possíveis são a perda ou extinção de contratos comerciais e de fornecimento com agentes europeus, o bloqueio de acesso a créditos ou financiamentos por instituições financeiras internacionais ou nacionais, a responsabilização individual ou solidária em eventuais casos de irregularidades nas cadeias de produção e suprimentos, entre outros.
Isso significa que, em relação às exigências de controle de impactos ESG nas cadeias de negócio e de publicação de Relatórios ESG já vigentes, as empresas e companhias brasileiras já podem estar sendo demandadas em seus contratos, parcerias ou negócios estabelecidos com empresas europeias, dada a obrigatoriedade destes mecanismos de práticas sustentáveis na governança e gestão empresarial em território europeu.
O ponto de atenção está no fato de que diversas empresas da cadeia industrial, de agronegócio, bens e serviços no Brasil são fornecedores ou parceiros comerciais de grandes companhias europeias e mundiais que distribuem ou comercializam produtos e itens brasileiros no continente europeu.
Em relação à Lei Antidesmatamento Europeia, em que pese a postergação da sua entrada em vigor para final de 2025, uma vasta gama do mercado brasileiro terá de se adaptar e desenvolver controles avançados sobre gestão ESG e prevenção a desmatamento em suas atividades, produtos ou serviços.
Números divulgados pelo Ministério da Agricultura, 30% das exportações brasileiras se relacionam com o mercado europeu, sendo que os impactos com a entrada em vigor da norma antidesmatamento europeia teria um potencial impacto na casa de 15 bilhões de dólares no setor de exportação brasileiro.
3. O QUE AS EMPRESAS BRASILEIRAS PRECISAM FAZER?
Para que as empresas e companhias brasileiras possam se adaptar e estar em linha com as exigências contidas nas referidas regras ESG da União Europeia, diversas estruturas, ações, mecanismos e redefinições são necessárias, de modo a reorientar a governança e a gestão dos negócios com olhos nos impactos e riscos ESG.
Em relação à regra sobre diligência prévia sobre impactos ESG, as empresas brasileiras devem desenvolver sistemas e políticas de: i) identificação, prevenção e mitigação de seus impactos adversos em matéria ambiental, social, de direitos humanos e corrupção; ii) adoção e transição para a mitigação das mudanças climáticas; iii) disponibilização de mecanismos de reclamação e denúncia para que os stakeholders; entre outros.
Quanto à regra ligada aos Relatórios de Sustentabilidade ESG, as medidas mínimas a serem empregadas pelas empresas brasileiras são: i) planejamento de Estratégia ESG corporativa anual para gerenciamento e controle de impactos ESG dos negócios; ii) realização do estudo de materialidade dos temas ESG prioritários da atividade; iii) planos de ação para execução de objetivos em temas ESG; iv) publicação de Relatório anual com as evidências e informações de desempenho ESG da empresa.
Por fim, sobre a regra antidesmatamento europeia, as empresas que exploram e produzem os bens e produtos abarcados pela norma (carne, café, óleo de palma, soja, madeira, celulose, papel, borracha e derivados como couro, móveis e chocolate) deverão se antecipar e implementar mecanismos e planos de gerenciamento e rastreabilidade socioambiental em face do ciclo produtivo de seus produtivos e serviços.
Esses mecanismos internos deverão observar controle de geolocalização, regularidade de fornecedores e produtores, auditorias e checagens nas áreas de atividades e produção, cumprimento de regras trabalhistas e de direitos humanos, entre outros requisitos a serem exigidos pelas autoridades europeias no ato da entrada dos itens no mercado da Europa, sendo ônus do produto brasileiro comprovar a regularidade.
PERSPECTIVAS PARA OS PRÓXIMOS ANOS
Todas as empresas brasileiras que atuam na indústria, agronegócio, bens e serviços e que integram as cadeias de valor e de negócios de grandes empresas atuantes na Europa deverão ser impactadas e terão de se adaptar a estes novos padrões de atuação e gestão empresarial.
Muitas destas exigências serão cada vez mais aplicadas a contratos e parcerias comerciais entre empresas brasileiras e europeias, o que deverá exigir preparação e antecipação de estruturas e controles nas indústrias e agroindústrias brasileiras.
O cenário confirma a importância das estratégias ESG nas empresas, com o especial fim de garantir a presença e a resiliência dos negócios em um mercado cada vez mais pautado pela sustentabilidade.
O Cabanellos Advocacia possui uma área de Integridade Corporativa & ESG com atuação específica nestes temas. Contate nosso time pelo e-mail: integridadeesg@cabanellos.com.br
Bruno Teixeira Peixoto
Advogado e sócio do Cabanellos Advocacia responsável pela área de Direito Ambiental e Litigância Climática e integrante do time de Integridade Corporativa & ESG. Doutorando em Direito Ambiental pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – FD-USP e Mestre em Direito Ambiental pela UFSC. Especialista em Compliance e Governança ESG.
José Augusto Medeiros
Advogado e sócio do Cabanellos Advocacia responsável pela área de Direito Econômico e Regulatório e integrante do time de Integridade Corporativa & ESG. Doutor em Direito Econômico pela Faculdade de Direito da USP. Mestre em Direito pela UFSC. Pesquisador vinculado ao Institut d’Études Politiques de Paris – Sciences Po Law School. Professor universitário de graduação e pós-graduação.
Foto: Shutterstock